20070101

Num azul das nuvens e preto do céu, intermitente.

Hoje conjuguei o verbo 'esvaiar' no tempo Sangue um monte de vezes.
Não, não era para incomodar ninguém nem me pediram para o saber fazer, só queria saber
qual era a sensação de estar frio.
E consegui. Pior : eu já a conhecia.
Vou pensar que está tudo bem e tudo normal. Como se me tivesse sido deixado um cobertor para o caso de me perder.
Como se, subitamente, nascesse o sol e me levasse, pela mão, ver o mundo.
Estou só a alucinar, deixa lá. Vai enchendo copinhos para eu beber depois.

Agora, fora de todos os contextos possiveis para o meu pensar :

Foram mortes, dias, traumas, certezas de incertezas e nada mais.
Foram ruas soltas, com o tempo aos saltos de um lado para o outro .
Foram árvores que se desprenderam das suas raizes sem razão.

E o que é a razão?
Não há razão.
Não há uma razão que me explique, agora, a forma cruel e triste desta minha ausência.

Olhas as horas com as mãos na cabeça
por este caminho onde já caminho faz muito tempo
olho ,também eu, todos os minutos, segundos e medos.

Foi desta.

Podes sim. Podes dizer que sou uma pedra mas sabes , pelo menos, qual é o maior medo de uma pedra?
Eu também não sei.
Mas digo-te :
O meu maior medo, enquanto pedra, é não ter na vida a água e o vento que me faça desaparecer, devagar.
E tu que sonhas... como se ainda sonhasses ser o meu sangue, escuta as derradeiras palavras que tenho para ti.
Pois já não és o meu sangue.
Não te esqueças do copo que tens entre mãos. Agora é veneno. É tempo perdido. É tudo o que me passou pela cabeça quando te vi.
É nada e tudo isso.

Não te conto o quanto a roupa que veste o meu corpo se quer rasgar. Não te conto
o quanto a verdade me quer sair dos dentes . Não te conto o quanto quero ,eu, explodir-me na tua boca,
arrancar-te o corpo e deixar-te a alma presa a uma dor parecida com a que tenho agora.

CHHHHH!

Por momentos o meu coração parou. O próprio tempo parou.
Por breves instantes as chamas voltaram e vim de encontro ao meu corpo com o fogo do teu corpo.
Tudo parou por um bocadinho mais.
Não conseguia ouvir nada a não ser tudo o que tinha dentro da cabeça. Conheces o sentimento?
Os meus olhos viam e pouco mais. As minhas pernas, já cansadas e comigo deitadas num chão de pedra
que fizeste só para mim, morriam e tremiam no frio da falta de sangue .
O som parou. A cabeça parou. E nada fui, nada tive, nada fiz naquele momento.
Enquanto os meus olhos viam ( e pouco mais faziam ), fui feliz.
Fui feliz , enquanto as pessoas falavam e eu não as ouvia.
E isto tudo, para dizer, que não quero que te esqueças.
Não quero que te esqueças dos meus olhos agora que te despejei o coração na roupa, na cara, no corpo.
E não quero que me procures, quando nas ruas com caminhos de números e casas de cruzes me derem um lar.
Gritei bem alto para ninguém ouvir e com as mãos no chão bebi-te o meu sangue,num azul das nuvens e preto do céu,
intermitente.
O resto do meu corpo caiu então.
Fui feliz. Para sempre.



. yan

1 comentário:

Anónimo disse...

Rapaz, ainda bem que eu sei ler :]
Escreves mesmo bem.

*