não sei. acho que sentia a pele colada à almofada. a cor da pele: é isso: a cor da pele colada
á almofada. se me levantasse todos os meus anos levantavam-se comigo e só deus sabe o peso e o incomodo
que era eu agora do nada empurrar o mundo para baixo.
assim como assim é sábado e o tecto escapa-se de bonito, foge-se de feio, chove dentro desta casa
como se as nuvens fossem metralhadoras de lágrimas, a minha bolsinha com as fotografias da Ana que
tirámos o ano passado quando ainda éramos felizes e dois toda molhada. mas que raio me deu para as por
ali e não cofre junto das notas antigas e das coisas com valor? gosto especialmente daquela foto em
que estás a arranjar o cabelo ao mesmo tempo que equilibras um travessão na ponta dos lábios e sorris
para a câmara. também gosto de perceber que não entrei nessa fotografia, tirei-ta. não faz
sentido roubar momentos a pessoas, pois não? e mesmo assim roubei-te aquele momento e nem o soube aproveitar.
é estranho como parece chover mais cá dentro que em todo o mundo. não vejo o sol há mais
de uma semana e o mesmo é dizer que me tenho afundado nesta cama e que estou cada vez mais doente
e fraco. pálido. se ainda não morri não ha-de faltar muito e é um caralho não conseguir dormir. a cama
parece que tem 7 lados e é toda pontiaguda raios e o barulho da água a cair na bolsinha de cabedal
fode-me os cornos tac tac por amor de deus desliguem o som da vida antes que eu dê em doido. é que
este tac tac, sempre presente em tudo o que eu vejo e escrevo ainda no outro dia o escrevi tac tac
uso-o para o bater dos relogios e o girar do resto tac tac irritantemente a lembrar-me de ti. e continua a chover
desalmadamente nos lugares que nos afastam, onde as flores ficam pálidas e murcham e outras nascem mas
já nao fazem sentido. se me levantar tomo banho e preparo um pequeno almoço, compro o jornal la em baixo
e vou até ao café com ele pela cabeça entro e digo bom dia.
( que anárquico que este desabafo está a ser )
estamos em agosto, ou em novembro. a minha barba cresceu como se eu já fosse um homem, já
pareço um homem agora, que mais queres tu? o meu cabelo também cresceu. talvez o corte mas depois
vou parecer um menino outra vez. gosto tanto das letrinhas das mercearias antigas que piscam,
alternadamente, Mer earia Opes M rceari Lopes Mercearia Lopes, num código - castiga-me que eu mereço
mas não assim - que nem o próprio merceeiro conhece. há bombas que explodem em todo o mundo, há
carne a subir e a descer, polvilhando a terra com sangue eu existo á espera do meu coração que não
explode de uma vez para me tirar daqui - castiga-me que eu mereço mas não assim. não sei se faço bem
em ficar por cá, estou a perceber agora que aquelas fotos que estão a desaparecer são o melhor que
me pode estar a acontecer. estou sozinho agora por pouco tempo, e as minhas ideias flúem como nunca.
há um pássaro que desce e canta muito rápido acompanhando a metralhadora que desfaz todos os pedaços
da tua cara e eu não o vejo mas sei que existe porque não estás cá e quando nos sentimos muito sozinhos
a ilusão do tamanho cresce e tudo parece maior e menos ocupado. não sei se me fiz entender mas foda-se
a ideia é básica.
quando suspiro nasce um zumbido longo nos meus ouvidos. a cidade que cresce lá fora com
o amanhecer ignora-me. falo sozinho e, ironicamente, ignoro tudo o que digo . a minha cabeça
é cinza. sou arrogante, trato mal as pessoas e construo uma especie de ritual que me faz enjoar
tudo o que faço, o que nunca fiz e o que( tarãaaa previsível ) - castiga-me porque mereço. assim não.
se a chuva parar entretanto paro de pensar, ou que chova tudo de ma vez e que o tecto caia
em cima de mim, assim como assim é sábado e não tenho nada para fazer. morrer nunca é má ideia
ao sábado.
( eu depois volto para escrever alguma coisa, prometo )
o céu parece mesmo o céu mas eu não sei o que ele é e o quão longe fica. talvez se eu abrir os braços
o apanhe, se eu esticar os braços o ultrapasse, se eu abrir os olhos... o faça cair.
vamos personificar o tempo e dizer que a mãe dele é uma puta, por favor!
3 comentários:
viciante
Gosto desta necessidade de te reler, procurando-te nos teus textos, achando-me nos teus textos.
meu querido Tiago, que porra de textos escreves tu. Que orgulho cresce em mim sem pedir permissão. orgulho, Tiago. Meu amigo.
O Filho da puta do Tempo !
[ / reflexo neste texto ]
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